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Coletivos Culturais: rota alternativa não é sinônimo de atalho

Se para andar de um lugar a outro, a estrada principal enfrenta algum obstáculo bem como buracos na via, falta de iluminação, acidente e etc, é comum a procura por caminhos alternativos. Estes nem sempre levam o automóvel no mesmo tempo de percurso ou comportariam a mesma quantidade de beneficiados, mas podem superar as expectativas e ser um ótimo recurso.


Em um país onde as estratégias de investimentos para políticas públicas - que diz respeito ao acesso à cultura, educação de qualidade e informação - são magras e falhas, e onde nem sempre os espaços públicos são compartilhados para a socialização, desabrocha uma necessidade em seguir pela rota alternativa. Metaforicamente, é nestas condições que pessoas se reúnem e caminham em prol de um objetivo comum, formando os chamados Coletivos.


A adesão de ideias criativas, improvisadas, organizadas, às vezes radicais, chamativas, escandalosas... não importa: desde que seja de cunho social, atinge diretamente o ponto frágil, seja ele no âmbito da educação, cultura, social, psicológica, de saúde, religiosa ou política. São diversos grupos espalhados. Com o crescente acesso à internet, instrumento de comunicação veloz e “democrático”, é possível observar que a formação destes coletivos culturais está ganhando notoriedade.


Há sete meses o Coletivo Corredor Cultural vem atuando junto a artistas, produtores independentes e cidadãos comuns, no objetivo de criar uma rede de diálogos e discussões entre as comunidades sobre novas formas de produzir arte e cultura, buscando a difusão e o fomento das atividades e linguagens artísticas presentes no município de Campo Limpo Paulista, interior de São Paulo. “Quando a ideia é minha ou sua, ela é apenas uma ideia... a partir do momento em que eu compartilho isso, ela se transforma, se realiza e não tem dono. Foi acreditando neste ponto de partida que entendemos que era possível estabelecer um diálogo livre entre as pessoas, onde todos são atores chaves para os trabalhos e resultados, cada um com sua vivência, experiência e formação. Não sentimos se seríamos ou não mais fortes, acreditávamos numa relação de um grupo de pessoas que juntos possuem voz ativa”, afirma William Sanches, 21 anos, Produtor cultural independente e Gestor Cultural do Coletivo Corredor.


Por outro lado, a barreira vai muito além de localizar pessoas dispostas a fazer a diferença, é preciso eficiência na organização e uma comunicação estreita entre os interessados pra que tudo dê certo. A partir do momento em que se reuniram, o grupo não tinha nenhum modelo de coordenação posto à prova, tudo ficou a cargo da experiência. “Nos dividimos em eixos chamados de GTs (Grupos de Trabalhos), que permitem nos organizar e sermos mais eficientes, aliando a outras plataformas, como as redes sociais, a fim de permitir maior acesso aos conteúdos do Coletivo e diálogos entre outros coletivos que nos ajudam a construir uma linha de trabalho mais coerente”, conta Sanches.


Sobre os chamados GTs, William Sanches explica que são três etapas para facilitar o diálogo e os pensamentos, “pra que a coisa não fique jogada”. O primeiro passo é fazer o cultural, a ação em si, a intervenção, no caso, o Sarau. O segundo passo é o Núcleo de Produção Cultural, pequeno grupo que conta com a participação de pessoas de fora, pra a troca de experiências e formas sustentáveis de produção cultural. E o terceiro é o da Comunicação. “Para nós é o que pega mais, pois não temos ninguém com formação na área, damos os nossos pulos”, esclarece.


É um pontapé inicial que cultiva entre as atividades realizadas o Sarau da Boa Vizinhança e no espaço Roda de Conversa – o qual traz discussões de assuntos específicos sobre articulações de projetos e políticas públicas para a área cultural. Como resultado, colhem a criação de uma comissão responsável em acompanhar a construção do Conselho Municipal de Política Cultural de Campo Limpo Paulista.


Outra grande expressão no contexto trata-se do Coletivo NU-MIC (Núcleo Urbano - Musical Independente Criativo), criado em 2011 por Mc’s e produtores de RAP de diferentes locais de São Paulo, frequentadores, à época, do estúdio aberto no Espaço Criança Esperança na Brasilândia. O ato consistiu na gravação de um CD cujas músicas remetiam ao dia a dia da periferia de São Paulo. Se a tentativa era trabalhar na divulgação do RAP, nada foi em vão. Formulado por Bruna Tiengo, 23 anos, psicóloga e assessora do NU-MIC e o participante David Madeirit, no ano seguinte o projeto “Desafio De Fio a Pavio” foi aprovado pelo VAI (Valorização de Iniciativas Culturais).


Desafio De Fio a Pavio consiste em compor, produzir e gravar músicas sob temas determinados, lidando com beatmakers, MC’s e aqueles que nunca tiveram contato com a atividade. Tudo, diga-se de passagem, ocorre sob o jugo de várias adversidades, entre elas: encontrar as pessoas interessadas, combinar os horários para realização das gravações, já que todos os organizadores não vivem exclusivamente de cultura, chegar no local onde seriam realizadas as gravações (devido aos ‘toques de recolher’ - na época São Paulo passava percalços por conta da relação conflituosa entre Policia e criminalidade), sem contar com o fator tempo. Enfim, fechar o produto mediante os infortúnios que a metrópole proporciona aos seus frequentadores, sem deixar de exigir qualidade no trabalho.


Ficou claro porque começar o nome da idealização com a palavra “Desafio” caiu bem pra ocasião? E não é só isto. Bruna Tiengo, também apresentadora e coordenadora de produção do “Desafio” esclarece: “Na primeira edição, em 2011, tivemos o apoio do Criança Esperança, até porque, foi lá que tudo começou. Em 2012 o único apoio financeiro foi o VAI. O Nu-mic, não tem grana de lugar nenhum”. Para gerar renda, o Coletivo vende camisetas, Cds e o estúdio de gravação, além dos encontros mensais, se realiza na residência de um dos coordenadores.


Desde sua criação, os Mcs André S/A, Tião Renascendo das Cinzas, Carol Protesto, Professor Xavier e Rodolpho JMZ e os beatmakers Nenê Beats, Guilherme Sallow e David Maderit e a produtora Bruna Tiengo, vem ajudando o grupo a se apresentar em eventos como: Ação Global, inauguração da Concha Acústica da Vila Mirante, vernissage da Exposição Desviolência na ONG Ação e Educativa, e em eventos das escolas da região da zona norte e sul da cidade.


A produção independente “Desafio de fio a pavio 2012” de Marlon Dell, disponível no Youtube, aprofunda sobre o processo de criação, concretização e algumas das recompensas colhidas pelo projeto, como é o caso do Professor Xavier, 22 anos: “Eu escrevia, mas não sabia para o que era. Descobri para quê; passar uma mensagem, ajudar as pessoas falando, cantando. Chegar lá e fazer alguma coisa, tentar mudar. Voltei a estudar por causa do RAP também. Se eu não tivesse ido à oficina, ido ao estúdio, conhecer todo mundo, talvez eu não estaria estudando hoje. Incentivar mesmo, estudar cultura, política, de tudo, onde você vive, o que você pode fazer para mudar, o CD é isto - juntar o pessoal, invadir e fazer acontecer”.


Rota alternativa não é sinônimo de atalho, no entanto, é interessante tanto quanto percorrer a estrada principal, pois o que faz a diferença é a força de vontade e a disposição para ajudar a formar uma sociedade melhor e mais democrática.



Serviço


Coletivo Corredor Cultural

E-mail: coletivocorredor@gmail.com


Desafio de Fio a Pavio

Site: http://defioapavio.tumblr.com/

E-mail: desafio.defioapavio@gmail.com


NU-MIC – Núcleo Urbano – Musical Independente Criativo

http://nu-mic.blogspot.com.br/

E-mail: contato.numic@gmail.com

Contato: (11) 9 8598-0672 / (11) 96732-5912




PUBLICADO EM REVISTA REBOSTEIO - 5ª EDIÇÃO | 2013

Destaque
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Tamires Santana

Tamires Santana é um ser vivo, dotado de inteligência e conhecimento (até que se prove o contrário). É pai, mãe e espírito - nem um pouco santo. Estuda, trabalha, busca, anda — principalmente de trem e bicicleta. Chegou a conclusão de que quanto mais se busca, menos se sabe. Gosta de falar sobre arte, cultura, cultura popular, política, economia solidária, design, religião, índio, folclore brasileiro, samba, carnaval, literatura infantil, ciência, criança,
desenho animado, cinema, plantas, minhocas, compostagem e um montão de outras coisa. É adepta da
filosofia de vida "é pra frente que se anda".

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